BOLSONARO É FASCISTA?
por Marcos Faber
www.historialivre.com
Recentemente foi lançado no Brasil o livro “Quando as Democracias Morrem” dos autores
norte-americanos Steven Levitsky e Daniel Ziblatt (Zahar, 2018). Segundo os
próprios autores, a motivação para escrever o livro veio do entendimento de que
a eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos representa uma
ameaça à democracia do país.
No livro os autores afirmam que, ao contrário do que
ocorreu no passado, quando democracias chegavam ao fim por meio de revoluções
ou golpes de estado, onde a violência estava presente, hoje os caminhos que levam
à morte de uma democracia são muito mais sutis. E começam com a eleição de um
líder carismático que não teme em desrespeitar liberdades individuais e
coletivas para alcançar seus objetivos.
Contudo, os autores afirmam que existe uma forma de
identificar um discurso avesso à democracia. Para eles existem quatro momentos
em que um aspirante ao poder dá mostras de seu caráter antidemocrático e
autoritário:
1.
Rejeita as regras democráticas: mesmo que suas afirmações não tenham
consistência ou comprovação, questiona a legalidade de instituições
democráticas, como decisões de tribunais ou o resultado das urnas em caso de
derrota;
2.
Nega a legitimidade de seus oponentes:
se diz o único
honesto, o único que pode salvar o país, o único que diz a verdade. Afirma ser
literalmente o salvador da pátria (“Make America
Great Again”, “Deus, Pátria e Família”);
3.
Tolera e encoraja à violência: faz piadas de cunho racista ou
homofóbico. É tolerante com a xenofobia, o machismo, a intolerância religiosa.
Invariavelmente exalta a ditadores ou torturadores do passado;
4.
Insinuam que podem retirar liberdades
civis ou até mesmo de setores da mídia:
direta ou indiretamente fazem afirmações que, caso cheguem ao poder, podem
restringir liberdades de crença, expressão, gênero ou comportamento.
Contudo, preciso lembrar que Levitsky e Ziblatt estão realizando
uma análise do caráter político de Donald Trump, em nenhum momento a realidade
brasileira entra na perspectiva dos autores. Mesmo assim, percebemos que todos
os elementos listados pelos autores podem facilmente ser associados a Jair
Bolsonaro.
A partir disso podemos afirmar que Bolsonaro é um líder
político antidemocrático e autoritário, apesar desta constatação já ser suficiente para
não votar nele, são características que não o tornam um fascista.
Para isso, precisamos entender o que é ser fascista.
Quando dou aula sobre o surgimento do nazismo e do
fascismo, procuro reforçar alguns conceitos que são, na verdade, características
das ideologias fascistas, são elas:
· Culto a figura de um líder carismático;
· Ditadura: o discurso fascista é antidemocrático,
em casos extremos pode levar ao totalitarismo;
· Nacionalismo: adotam políticas de valorização ao
nacional em detrimento ao internacional, em casos extremos levam à xenofobia,
isto é, ao ódio aos estrangeiros (como foi o caso dos nazistas em relação aos
poloneses);
· Hierarquização e militarização da
sociedade: a
estrutura do poder se torna tão rígida que, em alguns casos, chegam a colocar
militares em postos de comando;
· Ideologia conservadora: avessos aos avanços da sociedade. Quase
sempre idolatram um passado idealizado (não reproduzindo a realidade);
· Censura e controle de todas as mídias, assim
como censura prévia às expressões artísticas de vanguarda;
· Maniqueístas: enxergam a sociedade como dividida
em dois grupos, o bem e o mal. Por motivos óbvios, entendem-se como o bem. Por
isso, perseguem todos os que pensam diferente deles. Estimulam a violência contra
adversários políticos e minorias (gênero, étnicas, religiosas, sociais);
· Patriarcalismo: o homem é a figura de autoridade. Em
casos extremos leva à misoginia (aversão
às mulheres. A figura feminina deve ser dócil e mantida em submissão aos
desejos masculinos);
· Anti-intelectualismo: hostilidade e desprezo à
intelectuais e às Universidades (motivo: temem ser desmascarados);
· Anticomunistas: identificam todos os espectros ideológicos,
que não se enquadram em seu modo de entender a política, como comunistas (ou,
como ocorre hoje, esquerdistas).
Mas no Brasil atual, quem é que defende essas ideias? Apenas
o líder fascista? Ou a coisa é muito mais complexa do que parece?
Tem um livro que eu gosto muito chamado “Eu Sou a Lenda” de Richard Matheson. Sim,
é o livro que deu origem ao fraco filme com Will Smith. Mas posso garantir, o
livro é infinitamente melhor do que o filme!!! No romance o autor escreveu:
“normalidade é um conceito de maioria,
um padrão de muitos e não o padrão de apenas um homem”.
As bolhas
ideológicas* criadas pelas redes sociais possibilitaram que parte da
sociedade brasileira inconformada pelos avanços da sociedade, ou pelo politicamente correto, encontrassem outras
pessoas com ideias reacionárias sobre a sociedade. Nestes espaços, diferentes
formas de preconceitos, racismo e outras questões condenáveis, se tornaram
aceitáveis e, por incrível que possa parecer, se tornaram a “nova” normalidade, ao menos para essas pessoas.
Por tudo isso a verdadeira questão não é se Bolsonaro é ou
não fascista. Isso já está bem definido. A verdadeira questão é: o Brasil está se
tornando um país de fascistas?
* Redes sociais como o Facebook e o
YouTube possuem um
algoritmo que filtra o que é mostrado ao usuário, dando a ele apenas o que mais
lhe agrada ver e não enchê-lo com informações que não lhe interessem. O algoritmo
cria uma “bolha” com apenas informações que estejam associadas ao histórico de
navegação da preferência do usuário.
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