terça-feira, 9 de outubro de 2018

Bolsonaro é Fascista?



BOLSONARO É FASCISTA?

por Marcos Faber
www.historialivre.com
Recentemente foi lançado no Brasil o livro “Quando as Democracias Morrem” dos autores norte-americanos Steven Levitsky e Daniel Ziblatt (Zahar, 2018). Segundo os próprios autores, a motivação para escrever o livro veio do entendimento de que a eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos representa uma ameaça à democracia do país.
No livro os autores afirmam que, ao contrário do que ocorreu no passado, quando democracias chegavam ao fim por meio de revoluções ou golpes de estado, onde a violência estava presente, hoje os caminhos que levam à morte de uma democracia são muito mais sutis. E começam com a eleição de um líder carismático que não teme em desrespeitar liberdades individuais e coletivas para alcançar seus objetivos.
Contudo, os autores afirmam que existe uma forma de identificar um discurso avesso à democracia. Para eles existem quatro momentos em que um aspirante ao poder dá mostras de seu caráter antidemocrático e autoritário:
1.    Rejeita as regras democráticas: mesmo que suas afirmações não tenham consistência ou comprovação, questiona a legalidade de instituições democráticas, como decisões de tribunais ou o resultado das urnas em caso de derrota;
2.    Nega a legitimidade de seus oponentes: se diz o único honesto, o único que pode salvar o país, o único que diz a verdade. Afirma ser literalmente o salvador da pátria (“Make America Great Again”,  “Deus, Pátria e Família”);
3.    Tolera e encoraja à violência: faz piadas de cunho racista ou homofóbico. É tolerante com a xenofobia, o machismo, a intolerância religiosa. Invariavelmente exalta a ditadores ou torturadores do passado;
4.    Insinuam que podem retirar liberdades civis ou até mesmo de setores da mídia: direta ou indiretamente fazem afirmações que, caso cheguem ao poder, podem restringir liberdades de crença, expressão, gênero ou comportamento.
Contudo, preciso lembrar que Levitsky e Ziblatt estão realizando uma análise do caráter político de Donald Trump, em nenhum momento a realidade brasileira entra na perspectiva dos autores. Mesmo assim, percebemos que todos os elementos listados pelos autores podem facilmente ser associados a Jair Bolsonaro.
A partir disso podemos afirmar que Bolsonaro é um líder político antidemocrático e autoritário, apesar desta constatação já ser suficiente para não votar nele, são características que não o tornam um fascista.
Para isso, precisamos entender o que é ser fascista.
Quando dou aula sobre o surgimento do nazismo e do fascismo, procuro reforçar alguns conceitos que são, na verdade, características das ideologias fascistas, são elas:
·  Culto a figura de um líder carismático;
·  Ditadura: o discurso fascista é antidemocrático, em casos extremos pode levar ao totalitarismo;
·  Nacionalismo: adotam políticas de valorização ao nacional em detrimento ao internacional, em casos extremos levam à xenofobia, isto é, ao ódio aos estrangeiros (como foi o caso dos nazistas em relação aos poloneses);
·  Hierarquização e militarização da sociedade: a estrutura do poder se torna tão rígida que, em alguns casos, chegam a colocar militares em postos de comando;
·  Ideologia conservadora: avessos aos avanços da sociedade. Quase sempre idolatram um passado idealizado (não reproduzindo a realidade);
·  Censura e controle de todas as mídias, assim como censura prévia às expressões artísticas de vanguarda;
·  Maniqueístas: enxergam a sociedade como dividida em dois grupos, o bem e o mal. Por motivos óbvios, entendem-se como o bem. Por isso, perseguem todos os que pensam diferente deles. Estimulam a violência contra adversários políticos e minorias (gênero, étnicas, religiosas, sociais);
·  Patriarcalismo: o homem é a figura de autoridade. Em casos extremos leva à misoginia (aversão às mulheres. A figura feminina deve ser dócil e mantida em submissão aos desejos masculinos);
·  Anti-intelectualismo: hostilidade e desprezo à intelectuais e às Universidades (motivo: temem ser desmascarados);
·  Anticomunistas: identificam todos os espectros ideológicos, que não se enquadram em seu modo de entender a política, como comunistas (ou, como ocorre hoje, esquerdistas).
Mas no Brasil atual, quem é que defende essas ideias? Apenas o líder fascista? Ou a coisa é muito mais complexa do que parece?
Tem um livro que eu gosto muito chamado “Eu Sou a Lenda” de Richard Matheson. Sim, é o livro que deu origem ao fraco filme com Will Smith. Mas posso garantir, o livro é infinitamente melhor do que o filme!!! No romance o autor escreveu:
“normalidade é um conceito de maioria, um padrão de muitos e não o padrão de apenas um homem”.
As bolhas ideológicas* criadas pelas redes sociais possibilitaram que parte da sociedade brasileira inconformada pelos avanços da sociedade, ou pelo politicamente correto, encontrassem outras pessoas com ideias reacionárias sobre a sociedade. Nestes espaços, diferentes formas de preconceitos, racismo e outras questões condenáveis, se tornaram aceitáveis e, por incrível que possa parecer, se tornaram a “nova” normalidade, ao menos para essas pessoas.
Por tudo isso a verdadeira questão não é se Bolsonaro é ou não fascista. Isso já está bem definido. A verdadeira questão é: o Brasil está se tornando um país de fascistas?

* Redes sociais como o Facebook e o YouTube possuem um algoritmo que filtra o que é mostrado ao usuário, dando a ele apenas o que mais lhe agrada ver e não enchê-lo com informações que não lhe interessem. O algoritmo cria uma “bolha” com apenas informações que estejam associadas ao histórico de navegação da preferência do usuário.

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