Marcos Emílio Ekman Faber
Nos últimos dias tenho sido questionado por alunos,
amigos e colegas sobre uma série de informações relacionadas à crise política
brasileira. Na maioria dos casos se tratam de notícias que estão sendo
divulgadas pela internet, especialmente via Facebook.
De todas elas, a que mais me deixou intrigado foi a
relacionada ao Foro de São Paulo. Confesso que nunca dei muita importância a
esse fórum, entretanto como fui diversas vezes confrontado sobre a sua
importância política atual, resolvi pesquisar um pouco além daquilo que já sabia.
Contudo, acabei constatando que não havia muito o
que “descobrir” sobre o Foro. Mas, para minha surpresa, pude “descobrir” o que
os opositores do governo Dilma e demais grupos conservadores insinuam que o Foro
de São Paulo seja.
Mas antes de escrever sobre isso, quero mudar um
pouco de assunto.
Na década de 1920, logo após a Primeira Guerra
Mundial, a Alemanha viveu um processo doloroso de reconstrução. A crise
política gerada pela derrota na Guerra, proporcionou um acalorado embate entre
diferentes ideologias políticas sobre os destinos da Germânia. A esquerda se
dividia entre os comunistas e social-democratas. Os primeiros desejavam uma
revolução armada, os segundos defendiam a democracia e a eleição de uma
Assembleia Constituinte.
Já a direita, se radicalizava na figura de Adolf
Hitler. No discurso nacionalista e ultraconservador do líder nazista, a forma
da Alemanha retomar a grandeza passava pela identificação dos seus inimigos.
Para Hitler haviam dois diferentes inimigos. Os externos e os internos. Assim,
franceses e ingleses representavam os inimigos externos. Comunistas e judeus os
internos.
Para qualquer alemão da época era muito fácil
entender os motivos de ingleses e franceses serem identificados como inimigos. Já
quanto aos comunistas, o medo do controle soviético se encarregava de ser o
suficiente. Mas como justificar que os judeus (que tinham cidadania alemã e que
na verdade eram alemães) poderiam ser classificados como inimigos do país?
Para isso, os nazistas fizeram uso de uma série de calúnias e difamações aos judeus. Para eles os judeus eram os responsáveis pelo comunismo.
Hitler utilizava constantemente a expressão ”o comunismo judeu”, numa clara
alusão ao fato de Karl Marx, o “pai” do comunismo, ter origem nesta etnia.
Mas contraditoriamente, os nazistas também afirmavam que
os judeus eram os grandes “especuladores” da economia alemã, já que eram donos
de várias fábricas, bancos e empresas importantes da época.
Curiosamente
as duas acusações entravam em grande conflito. Afinal, como alguém pode ser
comunista e capitalista ao mesmo tempo?
Para justificar tais acusações, os nazistas
utilizaram os Protocolos dos Sábios do Sião. Um documento falsificado, mas que
foi divulgado como verdadeiro. Segundo este documento, as principais lideranças
judias conspiravam para conquistar o mundo, destruindo a civilização ocidental.
Mesmo que essa história pudesse ser facilmente
desmentida, agora os nazistas tinham uma justificativa para que o judaísmo
fosse perseguido e destruído.
Mas voltando ao Foro de São Paulo.
Em
março de 2014, o jornalista Felipe Moura Brasil, da Revista Veja, publicou uma
extensa matéria intitulada “Conheça o Foro de São Paulo, o maior inimigo do
Brasil“. A reportagem iniciava com a seguinte afirmação “O maior inimigo do Brasil e do
continente nas últimas décadas precisa ser identificado pelos homens de bem
deste país”. Note que na abertura do
texto há uma afirmação de que os “homens de bem”
precisam identificar quem são os inimigos do Brasil. Alguma semelhança com os
Protocolos dos Sábios de Sião?
Curiosamente sempre que o autor deseja dar sustentação ao seu
texto, cita a opinião de indivíduos ultraconservadores como Olavo de Carvalho e
José Carlos Wagner, mas nunca apresenta um contraponto. Mostra o Foro de São
Paulo como uma grande conspiração comunista pronta para dominar as Américas e, claro,
o Brasil. E, como em toda grande conspiração, o texto afirma que a
intelectualidade de esquerda no Brasil estaria omitindo do grande público a
existência desta organização.
Como se isso só já não fosse bastante fantasioso e falso, em
outras colunas e blogs da Revista Veja, como as de Reinaldo Azevedo e Augusto
Nunes, afirmam que o objetivo do Foro é fazer adeptos entre todos os
brasileiros. Começando pelos mais jovens, que seriam doutrinados nas escolas
públicas. Segundo os articulistas da Veja, os professores das áreas das
ciências humanas estariam fazendo propaganda e doutrinação do ideário comunista
no país.
Isso tudo é bastante ridículo e facilmente desmentido.
Contudo, as redes sociais estão repletas destas fantasias sendo propagadas e
afirmadas como se fossem verdades.
Mas afinal o que é o Foro de São Paulo? Como contraponto as afirmações da Revista Veja, transcrevo a
versão de outra importante publicação semanal, a Revista Carta Capital, que afirma que
o Foro de São Paulo “é um fórum de debates que discute as alternativas à visão
neoliberal da economia e da política. Esses grupos e partidos de esquerda
trocam experiências e conhecimento a respeito de como construir políticas
sociais. Explico melhor: no final dos anos 80, com a queda da União Soviética,
parecia que a esquerda estava destinada a acabar. Alguns até sugeriam que a
visão neoliberal da sociedade – baseada na utopia de que o livre mercado seria
capaz de promover crescimento econômico para todos – era o “fim da história”. O
Foro surgiu justamente para oferecer um contraponto a essa visão”.
Também é de extrema importância ressaltar que o fato de um partido político estar ligado a uma
associação de partidos é algo bastante comum. Na verdade incomum é quando um
partido político está isolado de seus correspondentes internacionais. Por isso,
dentro desta perspectiva, o PDT é membro da Internacional Socialista, o PSDB e
o DEM estão ligados à Internacional Democrata Centrista, o PSTU à Quarta
Internacional e assim por diante.
Para finalizar, se o Foro de São Paulo é, como tantas outras
organizações, apenas um fórum de contraponto às políticas neoliberais, por que
os setores conservadores brasileiros promovem “fantasias conspiratórias” a seu
respeito?
Foi por esse motivo que contei a história da justificativa
nazista à perseguição aos judeus. Afinal, um inimigo precisava ser identificado
para que a perseguição aos semitas fosse aceita. A caça ao inimigo necessitava
de uma justificativa, necessitava que existissem os “Protocolos dos Sábios do
Sião”.
E o Foro de São Paulo é apenas mais uma destas tantas falsas
justificativas que os setores conservadores da sociedade estão utilizando para
tomarem o poder de forma não democrática.
Portanto, se você não está satisfeito com o governo petista,
vote noutro partido na próxima eleição. Mas respeite a decisão das urnas. Não
dê voz a mentiras ou preconceitos. Pense por você mesmo, reflita, leia,
pesquise. Não acredite em qualquer coisa, principalmente quando a única fonte
que você possui sobre aquela notícia é o Facebook.
www.historialivre.com/blog
Nenhum comentário:
Postar um comentário