CHE DE HÉCTOR GERMÁN OESTERHELD e ALBERTO e ENRIQUE BRECCIA
“Che” é uma História em Quadrinhos - uma historieta, como dizem os argentinos – La Vida del Che foi originalmente publicada em 1968 com texto de Héctor Oesterheld e arte de Alberto e Enrique Breccia.
A HQ é uma daquelas obras cuja importância ultrapassa as barreiras do mundo especializado dos quadrinhos. E os motivos para isso são vários, a começar pelos artistas envolvidos na obra: Héctor Oesterheld, simplesmente um dos mais importantes (provavelmente o mais importante) roteirista de quadrinhos latino-americanos, cujas obras posso destacar “O Eternauta”, “Sherlock Time”, “Ernie Paick” e “Mort Cinder”, HQs que estão entre as mais importantes produzidas em nosso continente, e que alcançaram grande reconhecimento em todo o mundo, principalmente na Europa.
Se isso já não bastasse,
Oesterheld foi, em primeiro lugar, um ativista político. Um grande crítico da
sangrenta ditadura que se impôs na Argentina nos anos 1970. Ditadura, aliás,
que, no auge de sua intolerância e brutalidade, perseguia e calava seus
opositores. Infelizmente com Oesterheld não foi diferente, pois o autor foi
“desaparecido”, em 1977, pelo regime autoritário de seu país. Héctor é um dos
tantos intelectuais que a ditadura argentina deu cabo. Encerrando precocemente
a carreira deste excepcional autor.
Já quanto aos artistas Alberto Breccia e seu filho
Enrique, estão entre os mais fantásticos artistas gráficos a emprestarem seus
talentos aos quadrinhos, a melhor maneira de apresentá-los é sua própria obra.
Basta um folhada em “Che” para perceber que o que temos
em mãos é algo bastante acima do que usualmente encontramos em quadrinhos
convencionais.
Mas afinal, por que ler “Che”?
“Che” é uma obra focada num dos mais polêmicos e importantes personagens da História latino-americana: Ernesto Che Guevara. Ame-o ou odeie-o a realidade é que muitos dos seus seguidores e detratores pouco sabem sobre a vida ou o pensamento de Che Guevara.
A obra, obviamente toma partido das causas
latino-americanas defendidas pelo protagonista, entretanto, não nos apresenta
simplesmente para mais uma biografia de Che, mas para uma obra muito mais
intimista, focada no pensamento guevarista, para a forma como o guerrilheiro
enxergava o mundo a sua volta. Mesmo que a HQ não se aprofunde nas ideias do
protagonista, ainda assim, o quadrinho nos apresenta, mesmo que parcialmente, a
sua visão de mundo.
A começar pela forma
como Guevara entendia a origem das misérias da América Latina. Para Che uma revolução
não só era necessária, mas também passava, obviamente, pela libertação do domínio
europeu e norte-americano. Apesar de focar na libertação coletiva, Guevara
pensava também na libertação individual, principalmente para a forma como os
mais pobres poderiam alforriar-se da miséria e da opressão a que estavam
submetidos.
Para ele, a verdadeira libertação só poderia ser
alcançada por meio da educação... Somente com uma tomada de consciência a
respeito de quem somos e para onde desejamos ir é que alcançaremos a verdadeira
liberdade.
Curiosamente, a grande dificuldade de Che, principalmente
em sua campanha na Bolívia, foi a falta de consciência, não só uma falta de
consciência de classe, mas uma falta de consciência de quem se é. Os camponeses
com os quais Guevara se relacionou, estavam tão acostumados a miséria de suas
existências que sequer conseguiam imaginar um mundo diferente daquele aos quais
estavam inseridos.
Para piorar, não eram somente os camponeses que sofriam
com a falta de entendimento de seus papeis no mundo, afinal muitos dos companheiros
de armas de Che também padeciam deste mal.
Eduardo Galeano, em seu “Dias de Noites de Amor e de Guerra”, afirma que “Havia, entre os guerrilheiros, uns quantos índios. E eram índios quase todos os soldados inimigos. O exército os caçava na saída das festas e quando acordavam da bebedeira já tinham uniforme e arma na mão. Assim marchavam para as montanhas, matar quem morria por eles” (Porto Alegre: L&PM, 2001, página 14).
Essa era a luta que se espalhava por toda a América
Latina das décadas de 50 e 60... uma luta que ultrapassa o uso do fuzil. A
verdadeira LUTA deveria ser travada em todo o mundo... Uma guerra pela consciência...
para libertar e abrir os olhos... e ampliar a percepção sobre o mundo em que nós,
os principalmente os latino-americano, estamos inseridos...
E Ao contrário do que muitos
podem pensar... Che Guevara foi muito mais do um simples guerrilheiro, O
revolucionário argentino era dono de ideias próprias aos quais tentava aplicar
a sua vida na diária.
Delas destaca-se a ideia do HOMEM NOVO, um conceito “guevarista” que se repete na obra de Oesterheld. UM conceito que não nasceu com Che, mas foi particularmente importante em sua formação intelectual.
Para Guevara, uma revolução somente seria completa se ela
fosse capaz de criar o HOMEM NOVO, isto é, uma transformação social
somente seria possível a partir de uma transformação profunda das estruturas
mentais dos indivíduos. A Revolução começava dentro de cada um. Pois
enquanto os seres humanos estiverem dominados por uma mentalidade aburguesada e
individualista (focada no consumo), a sociedade não teria como ser transformada,
era necessário que os indivíduos passassem a pensar de forma coletiva.
Para Che Guevara a transformação social somente ocorreria
quando os homens fossem transformados, e a educação era a principal forma
desta transformação ocorrer. Para tanto, não somente a educação escolar ou
acadêmica seria o meio, mas era necessária TAMBÉM uma sociedade educadora, uma
sociedade transformadora.
Apesar deste conceito não ser esmiuçado pela obra de Oesterheld e Breccia, constantemente ela aparece nas reflexões do protagonista. Sua presença é uma constante em toda a HQ.
“Che” é uma daquelas obras que fundem
personagem/criador/e/arte. Formando um amálgama entre os diários de Che Guevara,
o texto de Oesterheld e a incrível arte dos Breccia, algo que dá como resultado
numa HQ única e impressionante.
E se os autores e o protagonistas possuem seus mitos... A
obra “Che” também possui uma história própria. Quando um Golpe de Estado, levou
a Argentina a uma nova e sangrenta ditadura, o quadrinho foi proibido no país, todos
os originais foram destruídos... por quase 20 anos o quadrinho foi esquecido...
até ser redescoberto na Espanha, na biblioteca de um colecionador. Foi assim
que “La Vida del Che” pôde ser republicada.
Foi essa a versão que em 2008 a Editora Conrad lançou
pela primeira vez no Brasil, desde então a HQ estava fora de catálogo ... só agora,
com a COMIX ZONE, uma editora independente, dos sócios Thiago Ferreira e Ferréz
(ambos com canais por aqui no YouTube), que o quadrinho pôde ser Relançado... vou
deixar o link desta edição aqui na descrição.
“Che” representa muito mais do que um simples quadrinho... “Che” nos apresenta uma condensação de talentos pouco antes vista. Da história do personagem à arte... tudo é inspirador. Tudo inspira... Se você possui preconceitos com quadrinhos, bom... ‘Che” é para você... Mas prepare-se, pois após ler esta HQ, outros quadrinhos certamente virão...
EU SOU MARCOS FABER
E VOCÊ ESTEVE CONECTADO AO HISTÓRIA LIVRE
EM BREVE NOVAS REFLEXÕES SOBRE O IRREFLEXÍVEL.
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